Enfraqueça seus jogadores, tire a rodinha da bicicleta - Dose de XP #21
- Italo Wolff, Jogador e Mestre do Metajogo
- Mar 26, 2023
- 3 min read
Se você não enfraquecer seus jogadores, a jornada será previsível e repetitiva. Experimente essas pequenas desvantagens para vê-los se esforçando.

Todos nós, nascidos na década de 1990, conhecemos o “dilema de Dragon Ball”. Na primeira temporada da série, os personagens têm poucos poderes e o protagonista consegue voar apenas com auxílio de uma nuvem mágica. Na primeira saga do sequel, Dragon Ball Z, o vôo é generalizado e poderes são mais comuns. Na batalha final da saga Freeza, a vida na Terra é ameaçada. Na saga Cell, o próprio planeta pode ser destruído caso os poderes sejam mal utilizados. Na quarta e última saga, a Terra de fato é destruída e reconstruída várias vezes e ninguém mais entende por que os personagens insistem em trocar socos ao invés de usar o arsenal de poderes nucleares.
O problema decorre da estrutura dramática da série: há um desafio - os protagonistas treinam para superá-lo - é insuficiente e os heróis apanham - algum apelo emocional faz com que eles se esforcem ainda mais - sucesso, eles ficam mais fortes e derrotam o vilão. Mas, quando chega a próxima temporada, o novo vilão precisa ser mais ameaçador que o último.
Essa situação acontece em histórias épicas cuja resolução depende da competência dos protagonistas. Nas histórias épicas, os heróis são cavalheirescos e honestos (o que significa que precisam merecer a vitória, não podendo trapacear ou terminar a jornada sem evoluir de alguma forma). Se a linguagem da resolução de conflitos for a porradaria, como é o caso da maioria dos RPGs, o dilema de Dragon Ball está anunciado.
Em algum grau, isso é esperado – basta ler a lista de magias nos primeiros e últimos níveis, e comparar os monstros de nível de desafio baixo com os antagonistas mais fortes. No começo, o mago de D&D atira a Flecha Ácida de Melf (em média 15 de dano) e no final ele invoca enxame de meteoros (40d6 de dano); no começo mata goblins e kobolds e no fim mata dragões e tarrasques.
Entretanto, esse sempre foi um fator que me irritou em jogos como D&D, por diversas razões. Primeiro: existindo magos capazes de invocar chuvas de meteoros, por que diabos confiaram a salvação do reino a mim, que ainda estou tentando aprender a mágica de tirar o nariz da criança com o dedão? Segundo: quem foi que dispôs os inimigos em ordem crescente de força? Terceiro: se quanto mais forte eu fico, mais inimigos fortes aparecem; eu deveria parar de evoluir ou vou acabar atraindo um deus maligno. Quarto: essa estrutura é chata.
Felizmente, o golpe está aí e só cai quem quer; existem formas de evitar essa bobagem repetitiva. Como já anunciei, dois fatores colaboram para essa estrutura dramática – o gênero épico e o conteúdo com foco no combate. Alterando esses fatores, podemos contar histórias diferentes, ou contá-las de forma diferente.
Para quebrar o ciclo vicioso, experimente aumentar a dificuldade dos desafios enfraquecendo os jogadores, em vez de aumentar a força dos adversários. Além de cumprir a tarefa de apresentar um problema à altura, você obrigará os jogadores a ser criativos para suprir a deficiência. O trabalho deles vai deixar de ser simplesmente procurar na ficha um poder que solucione o obstáculo, eles vão ser trazidos para dentro do jogo ao ser obrigados a pensar em algo novo. Mais importante ainda: existem várias formas de enfraquecer os jogadores, mas apenas uma de fortalecê-los.
Experimente jogar sem visão no escuro (darkvision) e veja os jogadores voltarem a ter medo das sombras.
Experimente jogar sem descansos em zonas perigosas e veja os pontos de vida caírem sem que você precise causar mais dano.
Experimente jogar em terrenos diversos e veja os jogadores estranhando suas próprias fichas. Na água, magias de fogo, gelo e elétricas se transformam, os martelos dos bárbaros ficam inúteis e a armadura dos guerreiros os arrasta para baixo.
Experimente jogar com a lógica e não apenas com a regra. Um jogador quer passar por um espaço estreito? Ele precisa então tirar a armadura. Essa exigência não está explícita nas regras, mas é o que diz o bom senso. Investir em alguém sem armadura garante maior probabilidade de acerto sem necessidade de apresentar monstros com bônus de ataque enormes.
Experimente jogar sem perícias inúteis. O procedimento para encontrar coisas escondidas, por exemplo, é muito melhor sem rolar dados. Se um objeto foi ocultado embaixo da cama e o jogador diz que vai procurar embaixo da cama, não há mais o que discutir – corte o teste de percepção. O mesmo serve para detectar armadilhas. Na prática, isso deixa o jogo mais difícil por obrigar o jogador a pensar e descrever exatamente o que está fazendo, em vez de simplesmente rolar um dado que resolva qualquer questão por ele. O procedimento também pode ser usado para escrever cartas, contar mentiras elaboradas de antemão e corroboradas por vários personagens, etc.
Gostei das dicas, eu queria colocar comida por descanso, você só descansa curto ou longo consumindo comida que trouxe ou pegou, os exploradores poderiam buscar comida 1x por dia, mas conversando com meus jogadores eles acharam ruim ter que ficar contando quantas rações tem na ficha e consumo.